Devedor tem liberdade para aglutinar credores na recuperação extrajudicial, diz STJ
O devedor que pede a recuperação extrajudicial pode exercer com liberdade a definição das classes ou grupos de credores a serem abrangidos a partir de critérios diversos, desde que relacionados a alguma característica original do crédito.
Grupo econômico do ramo da construção aglutinou credores e obteve ocram downpara aprovar recuperação extrajudicial
A conclusão é da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que manteve a homologação do plano de recuperação extrajudicial do Grupo Fidens, que atua nos ramos de construção pesada e mineração.
Arecuperação extrajudicial (https://www.conjur.com.br/2024-mai-10/mudanca-cultural-e-reforma-na-lei-fazem-explodir-as-recuperacoes-extrajudiciais/)recuperação extrajudicialé um procedimento de soerguimento que passa pelo Judiciário, mas tem caráter contratual, de renegociação privada das dívidas para equacionamento da crise econômico-financeira.
Ao contrário do que ocorre na recuperação judicial, não há acompanhamento pelo juízo universal e o descumprimento do plano aprovado pelos credores não leva à falência.
Nesse contexto, a 4ª Turma do STJ adotou uma interpretação menos restritiva do 163 daLei 11.101/2005 (https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm)Lei 11.101/2005, que trata da possibilidade do chamadocram down— a imposição da recuperação extrajudicial, mesmo sem a aprovação de todos os credores.
A norma diz que o devedor pode requerer a homologação do plano, desde que assinado por credores que representem uma quota mínima dos créditos.
Na redação original da lei, essa cota era de 3/5 de todos os créditos de cada espécie por ele abrangidos. O recurso foi julgado considerando essa regra. ALei 14.112/2020 (https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Lei/L14112.htm#art1)Lei 14.112/2020reduziu esse mínimo para “mais da metade dos créditos”.
Para definir a quem a recuperação judicial se impõe, o parágrafo 1º do artigo 163 confere ao devedor a possibilidade de adotar as espécies de crédito previstos no trecho da lei que trata da falência (créditos trabalhistas, quirografários e subordinados) ou fazer a aglutinação deles.
Nessa segunda hipótese, o devedor pode unir grupo de credores de mesma natureza e sujeito a semelhantes condições de pagamento. Se mais de 3/5 deles (pela regra original) aprovarem o plano, o restante também deve se submeter.
No caso do grupo Fidens, a aglutinação envolveu 620 credores, dentre os quais dez recorreram da sentença de homologação do plano. Eles entenderam indevida a aglutinação de quirografários, microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP) num único grupo.
A alegação é de que a medida ofendeu a preferência legal de créditos estabelecida pela lei, o que possibilitou que apenas três credores impusessem a aprovação do plano em relação a todos os demais.
Relator do recurso especial, o ministro João Otávio de Noronha apontou que, para fins de recuperação extrajudicial, não é preciso que o quórum de devedores seja apurado nas classes de créditos previstos para a falência (artigo 83 da lei).
Isso porque o propósito do legislador foi estabelecer um mecanismo menos burocrático para a recuperação extrajudicial. E o fez justamente ao permitir que o devedor selecione grupo de credores que tenham pontos em comum.
Ao citar doutrina de Bullamah & Schneider, defendeu que não há rigidez na definição das classes ou grupos de credores a serem abrangidos pela recuperação extrajudicial, podendo a empresa devedora e credores adotar critérios diversos, desde que relacionados a alguma característica original do crédito.
“Não há óbice à aglutinação de créditos quirografários com aqueles titularizados por microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP) num único grupo na recuperação extrajudicial, quando tiverem natureza e condições de pagamento semelhantes, garantindo-se tratamento homogêneo a cada classe ou grupo de credores por ela abrangido.”
Essa interpretação foi a usada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que manteve a homologação do plano. Concluiu a corte estadual que a sujeição dos credores ME e EPP ao plano de recuperação extrajudicial era necessária, considerando aspectos práticos.
Em voto-vista, a ministra Isabel Gallotti apontou que, após as modificações da Lei 14.112/2020, os créditos de microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP) não têm mais distinção na ordem de classificação de créditos na falência.
Cliqueaqui (https://www.conjur.com.br/wp-content/uploads/2025/09/STJ_202203233390_tipo_integra_319032823.pdf)aquipara ler o acórdãoREsp 2.032.993