Governo federal ameaça retirar incentivos à ZFM e põe em risco 14 mil empregos

01/11/2017

Um dia depois de a maioria da bancada do Amazonas na Câmara dos Deputados votar a favor do presidente Michel Temer, livrando-o da denúncia de formação de quadrilha e obstrução à justiça e evitar a abertura de processo no Supremo Tribunal Federal (STF), o governo dele surpreendeu com uma medida que pode esvaziar o polo de concentrados da Zona Franca de Manaus (ZFM), responsável por mais de 30% das exportações, com faturamento anual de R$ 548,8 milhões e geração de 14 mil empregos diretos, chegando a 70 mil toda a mão de obra envolvida na cadeia produtiva.

Os oito deputados federais e os três senadores receberam ontem um comunicado do superintendente da Suframa, Appio Tolentino, informando que o Ministério da Fazenda mudou o enquadramento da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) para a fabricação de extrato de concentrados de refrigerantes no Polo Industrial de Manaus (PIM). Com isso, as indústrias locais perdem o direito à isenção de PIS/Cofins, Imposto de Importação (II) e o Imposto sobre Produtos Industrializado (IPI), o que na prática inviabiliza a produção local.

Segundo o titular da Suframa, as empresas de concentrados utilizavam a nomenclatura NCM 2107 desde o ano 2000, na forma de kit, mas a Secretaria da Receita Federal (SRF) entendeu que o kit deve ser classificado individualmente; com isso os componentes de valor mais significativo (que contêm ingredientes fundamentais no aroma e sabor) devem ser classificados como NCM 2106.9010, cujas alíquotas dos tributos são diferentes de zero.

“A depender do novo enquadramento suscitado pela SRF, haverá imensurável prejuízo socioeconômico ao Polo Industrial de Manaus (PIM), cujas vantagens comparativas deixariam de existir”, afirma o superintendente da Suframa no ofício encaminhado à bancada amazonense.

Dados do setor

Bebidas e concentrados estão entre os dez setores em faturamento e geração de emprego na Zona Franca de Manaus. Em 2013, chegou a gerar mais de 14 mil empregos diretos, incluindo as etapas em Maués, onde ocorre o cultivo do guaraná, e em Presidente Figueiredo – etapa do plantio e industrialização do açúcar e álcool utilizado no processo. Segundo dados da Fieam/Cieam, ao todo são cerca de 70 mil empregos diretos e indiretos envolvidos na cadeia produtiva local, isso porque atende a 95% do mercado de refrigerantes no País e ainda exporta para a Venezuela, Colômbia e Paraguai.

Estudo da Fundação Getúlio Vargas destaca que o setor de concentrados, além dos empregos criados na ZFM, é o único a gerar riqueza para o interior do Estado do Amazonas, com o agronegócio e a agricultura familiar.

Redução do IPI

Os 156 fabricantes de refrigerantes regionais vêm tentando há algum tempo se equiparar aos incentivos fiscais e tributários existentes na Zona Franca de Manaus. A cada medida provisória tratando de tributos, deputados e senadores de outros estados principalmente do Paraná incluem emendas reduzindo a alíquota do IPI dos concentrados de 20%, cobrado hoje para quem está fora do Amazonas, para 12% em 2018, 8% em 2019 e 4% em 2020. Em todas as tentativas, a bancada amazonense tem conseguido impedir a aprovação de emendas que reduzem o IPI dos concentrados.

Insegurança jurídica

Na opinião dos empresários do PIM, com essa medida, a indústria de bebidas perderá toda a competitividade porque deixará de creditar os tributos para outros mercados e que fatalmente os produtores vão deixar não somente o Amazonas, rumo ao Sul e Sudeste do País, mas poderão migrar até para os países da América Latina. “Basta uma medida tributária a ser adotada pelo México, com mais vantagens que a Zona Franca para levar essa indústria daqui do Amazonas”, alerta um empresário do setor de bebidas que pediu para não divulgar o nome.

Em nota, a Federação e o Centro das Indústrias (Fieam/Cieam), por meio da representação em Brasília, declara que “as indústrias de concentrados estão instaladas na ZFM há pelo menos 30 anos e recebem incentivos baseados em atos concessivos da Suframa, que estabelecem as posições tarifarias a serem utilizadas, por isso, é inaceitável qualquer mudança de regra no meio do jogo, sob risco de contaminar, com insegurança jurídica, todo o modelo de desenvolvimento amparado pela ZFM. O direito adquirido deve ser respeitado sob pena de cairmos no abismo da insegurança generalizada”.

Audiência com ministro

Foi imediata a reação de alguns membros da bancada amazonense, ao receberem ontem o ofício/circular 29/2017, do superintendente da Suframa, Appio Tolentino. Da tribuna do Senado, A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM-AM), protestou: “A maior parte da nossa bancada vota para permanecer Temer e recebe como troco isso aqui. (mostrando o ofício). Esse é o Michel Temer que recebe seus aliados com sorriso e por trás faz o contrário. Vamos lutar muito para derrubar essa decisão”. Vanessa pediu uma audiência com o ministro da Fazenda, Henrique Meireles. O coordenador da bancada, Átila Lins (PSD-AM), confirmou o recebimento do comunicado da Suframa e prometeu convocar uma reunião da bancada parlamentar na semana que vem.

O deputado Pauderney Avelino (DEM-AM) explicou que essa medida do Ministério da Fazenda já vinha sendo estudada há algum tempo. “Se a medida transforma em alíquota zero, o produto não leva crédito. Atualmente, o IPI dos concentrados é de 20%. Sem o crédito, perdem sim competitividade. Isso é uma guerra antiga que sempre reaparece quando o governo precisa arrecadar”, declarou Pauderney.
 

Fonte: A Crítica