CPMF é imposto muito ruim e há alternativas, diz Scheinkman

06/11/2015

A Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), principal aposta da equipe econômica para evitar um déficit das contas públicas no ano que vem, é considerada um imposto ruim e regressivo por José Alexandre Scheinkman, professor de economia da Universidade de Columbia (EUA).

Para o economista, a CPMF é um imposto "absurdo" porque incide sobre cada transação e levaria a distorções muito grandes no sistema produtivo. "Quem produz em casa não pagaria, quem compra insumo pagaria". Um exemplo simples, diz, é que a indústria de automóveis que compra pneu vai querer produzir o pneu para deixar de pagar o imposto, com provável redução da produtividade do setor, por reduzir o grau de especialização.   Para ele, a Cide sobre combustíveis é um imposto melhor, "e não é porque estou em conselho de empresa da agroindústria, mas porque me preocupo com aquecimento global. Acho que aumentar o preço do uso do carro é uma boa ideia".    O economia avalia que, no curto prazo, a saída para a questão fiscal virá do aumento de impostos, mas que é preciso pensar além do curto prazo. "Não deveríamos desperdiçar uma boa crise e usar o momento atual para fazer o que precisa fazer", brincou.   Uma das prioridades deveria ser desmontar alguns gatilhos que vão piorar a situação fiscal no longo prazo, como o déficit da Previdência. A lei sancionada ontem pela presidente Dilma Rousseff faz pouco para resolver o problema, afirma, e é preciso pensar em idade mínima para aposentadoria, além de equiparar a idade entre mulheres e homens.    Outra questão, segundo ele, é que além do aumento de impostos no curto prazo, é preciso que o país volte a crescer para contribuir para equacionar o problema fiscal no médio prazo. O crescimento, afirma, vai depender do aumento da produtividade.   Questionado sobre a ineficiência do setor público, Scheinkman disse que o problema só vai ser resolvido quando o Estado fizer menos. "Tem coisas que são difíceis de serem feitas por grande órgão central, [o Estado] faz mais coisas do que no resto do mundo. Precisamos fazer menos e melhor. Essa incompetência no setor público e muito custosa", disse.   Scheinkman participa de evento promovido pelo Insper chamado "A racionalidade das escolhas: Políticas econômicas para crescer e qualidade dos gastos públicos".    Crescer mais   Para Scheinkman, o Brasil precisa se integrar mais à economia global, aumentar o investimento público em pesquisa e desenvolvimento e incentivar a competição entre firmas se quiser deixar para trás o baixo crescimento da produtividade que marcou o desempenho da economia nos últimos 30 anos.   O economista acredita que o país enfrenta três problemas. Uma conjuntura muito adversa no curto prazo, uma crise fiscal estrutural que ainda vai ser um problema no longo prazo e baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em relação a países semelhantes.   Para ele, a produtividade no Brasil cresceu 20% a menos do que a americana nos últimos 30 anos. Os EUA são tidos como fronteira por serem o país mais produtivo do mundo. Neste mesmo período, a produtividade na Coreia e na China cresceu cerca de 180% do aumento observado pela produtividade americana no período.   A China, que partiu do mesmo ponto do Brasil na década de 1980, deve em alguns anos chegar no mesmo lugar da Coreia, que hoje tem produtividade de cerca de 60% da americana.    Segundo Scheinkman, não é nem a baixa qualificação do trabalhador e nem o estoque de capital insuficiente que determinam a expansão do PIB brasileiro em ritmo inferior ao visto nos Estados Unidos. "Não quero diminuir a importância do fato de termos estoque de capital inadequado, resultado de baixo investimento, ou população pouco educada, mas a gente usa o que temos de forma pouco eficiente. Mesmo se resolvermos esses problemas, vamos continuar a crescer pouco sem resolver a produtividade".   Para ele, resolver o problema da produtividade depende de uma série de medidas, como aumento de investimento em infraestrutura, facilitar o sistema de impostos, que é complicado e não isonômico, além tornar o ambiente regulatório mais claro.    Scheinkman, porém, avalia que há três itens que são essenciais e complementares: aumento da integração do Brasil à economia global, aumento da concorrência entre as companhias domésticas e ampliação dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento.    Para o economista, o Brasil é um dos países menos integrados ao comércio global e poderia ter ganhos relevantes com maior abertura. "Permitiria maior especialização em produtos em que se tem vantagem comparativa, porque o comércio é maior, os preços para os consumidores tendem a se reduzir e os produtores têm acesso a insumos melhores e mais baratos".   Scheinkman citou também os ganhos de escala que viriam da maior integração, além do aumento do conhecimento das empresas, por meio do contato com os importadores, o que elevaria a produtividade dessas companhias.    Na mão contrária, diz, a proteção de determinados setores tem como contrapartida desproteger os segmentos que dependem de quem recebe incentivos, porque os insumos tendem a ficar mais caros. "Esse é o conceito de produtividade efetiva, que diminui atratividade de investimentos em setores que dependem de insumos de setores protegidos".   Em sua avaliação, só deveria haver proteção caso fossem verificáveis as externalidades positivas para a sociedade desse benefício, "para que ele não vá apenas para o bolso da firma". Scheinkman criticou ainda a política de conteúdo local, que enriqueceu muita gente, mas encareceu a produção de petróleo no Brasil. "Com bastante subsídio, se produz até rum na Europa, mas vamos ser muito pobres se essa for a opção", diz.    Para ele, é essencial negociar tratados de livre comércio fora da esfera do Mercosul, além de diminuir barreiras à importação. Em relação à concorrência, o economista enxerga necessidade de um sistema tributário mais horizontal. O Simples, diz, pode ter ajudado a reduzir a informalidade, mas criou uma barreira para o crescimento das empresas.   Outra dificuldade é que a inovação costuma vir de empresas "outsiders", ou de fora do sistema, e as políticas atuais são focadas em proteger a continuidade das empresas existentes. Por isso, afirma, é preciso reduzir o papel do BNDES na economia e dar fim à política de campeões nacionais. "As empresas mais produtivas ganham mercado em relação às empresas menos produtivas. A produtividade aumenta porque a massa de fábricas de baixa produtiva vai desaparecendo. A desregulação também ajuda".    No Brasil, comenta, o caminho tem sido o contrário. "Basta pensar no tempo que se gastou debatendo o que poderia ser vendido em farmácias". Por último, afirma, o país precisa melhorar o investimento em pesquisa e desenvolvimento. As universidades públicas, por exemplo, têm que ter arcabouço para incentivar transferências de inovações para o setor privado.    Em sua avaliação, o setor agrícola é um bom exemplo de como aumentar a produtividade de um setor. Houve incentivos do governo para pesquisa, com a Embrapa, desregulamentação do mercado na década de 1990, o que levou a produção a migrar de produtores, com ganhos de escala. Por último, o país ficou exposto a concorrência global.   "Se tivéssemos sido sérios na questão da agricultura familiar, ainda estaríamos importando comida. Como só falamos nisso, mas fizemos pouco, ganhamos escala". As políticas de crédito subsidiado também são mais horizontais no setor, embora Scheinkman as considere desnecessárias.
Fonte: UOL